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Quando o amor parece ruir: meditação sobre as crises no relacionamento

Você chegou até aqui procurando respostas, talvez ansiando por um questionário que lhe indique, com a frieza das estatísticas, se deve prosseguir ou recuar, se há esperança ou apenas ruínas.

Mas é preciso dizer-lhe, com toda a serenidade e firmeza: não existe questionário capaz de medir a complexidade de dois seres humanos que, um dia, se encontraram e se prometeram, implicitamente ou não, caminhar juntos. A crise que agora você enfrenta não é um acidente; tampouco é um erro. É um chamado.

A crise não é um abismo que se abriu subitamente, mas o afloramento daquilo que, em silêncio, foi sendo construído ou negligenciado ao longo do tempo. Ela não chega para destruir; chega para revelar. Revela quem você é, quem o outro é, e quem, juntos, vocês decidiram não ser ou, quem sabe, ainda podem escolher se tornar.

Talvez você sinta, nesse momento, uma vontade urgente de fugir, ou então um desejo obstinado de vencer o outro, de provar razão, de impor a sua dor como medida do fracasso alheio. Mas saiba: enquanto fizer do outro o réu, e de si a vítima ou o juiz, perpetuará a crise e agravará a ruína. O verdadeiro caminho não é o da vitória, mas o da compreensão — que não significa condescendência, mas sim lucidez.

Se quer, de fato, caminhar através da crise, pare agora. Silencie as acusações. Suspenda o julgamento. Pergunte-se com honestidade: "O que me falta compreender? O que me cabe mudar? Estou disposto a escutar ou apenas a exigir?".

Você pode ter se esquecido, ou talvez nunca tenha sabido, que o amor humano é um exercício constante de renúncia ao próprio egoísmo. Não aquele amor romântico e idealizado, sustentado apenas por emoções volúveis, mas o amor enraizado na vontade de querer o bem do outro, mesmo quando esse bem exige o sacrifício de nossas expectativas mais queridas.

Sim, as crises são dolorosas. Mas, se acolhidas com humildade, tornam-se fecundas. Elas exigem virtudes esquecidas pelo tempo: a paciência, que suporta o outro sem ceder ao rancor; a fortaleza, que permanece, mesmo quando o afeto vacila; a esperança, que crê que ainda há um bem possível, mesmo quando tudo parece perdido.

Não se iluda: não há atalhos. Não existe teste de compatibilidade que possa dizer-lhe o que fazer. Existe, sim, um chamado à responsabilidade. Você não está diante de uma decisão de conforto, mas de uma escolha que define quem você é e quem deseja ser.

Talvez, ao olhar para o outro, você veja alguém estranho, alguém que já não reconhece, ou que parece não mais reconhecer você. É assim mesmo. A convivência, quando despida das ilusões iniciais, revela o outro em sua verdade — com fraquezas, limites e, muitas vezes, com feridas que você não causou, mas que agora lhe cabe decidir se quer ou não carregar.

A crise é, portanto, uma convocação à maturidade. Você pode escolher permanecer na superfície, alimentando ressentimentos, ou pode adentrar no território mais profundo, onde não se pergunta "o que o outro me deve?", mas sim "o que eu posso fazer para que esta relação seja mais verdadeira, mais digna, mais humana?".

É possível que, após esse caminho, você descubra que o mais nobre é continuar, renovando compromissos, refazendo pactos. Ou, quem sabe, reconhecerá que a separação é o único modo honesto de evitar a destruição mútua. Mas não apresse essa conclusão. Antes, esgote a reflexão, o esforço, a tentativa sincera de restaurar o que foi perdido.

E se decidir seguir, saiba: a relação nunca mais será a mesma. Nem deve ser. O amor que sobrevive à crise é outro: mais consciente, mais sólido, menos ingênuo, mais forte. Porque a crise é o fogo que purifica — queima as ilusões, mas deixa o ouro, se ele existe.

Por isso, não fuja da crise. Não a tema como quem teme o fim, mas acolha-a como quem compreende que só há vida verdadeira onde há também a coragem de morrer para aquilo que é superficial.

Você veio aqui buscando um questionário. Eu lhe ofereço, ao invés disso, um espelho. Olhe-se com coragem. E, olhando, escolha não o que lhe traga mais conforto, mas aquilo que, mesmo custando-lhe muito, o conduza a ser alguém melhor: mais verdadeiro, mais justo, mais capaz de amar de modo íntegro e fecundo.

Esse é o único caminho que torna a crise uma oportunidade — não para simplesmente salvar um relacionamento, mas para salvar a si mesmo da mediocridade, da fuga, do autoengano.

A crise, portanto, não é o fim. É o começo da verdade. E só quem ama a verdade, mesmo quando ela é dura, é digno de amar e de ser amado.

Siga em frente, com firmeza e com dignidade.

 
 
 

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